Resolução CNJ nº 225 de 31/05/2016


Print Friendly, PDF & Email

Ementa: Dispõe sobre a Política Nacional de Justiça Restaurativa no âmbito do Poder Judiciário e dá outras providências.

Origem: Presidência

O PRESIDENTE DO CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA (CNJ), no uso de suas atribuições legais e regimentais,

CONSIDERANDO as recomendações da Organização das Nações Unidas para fins de implantação da Justiça Restaurativa nos estados membros, expressas nas Resoluções 1999/26, 2000/14 e 2002/12, que estabelecem os seus princípios básicos;

CONSIDERANDO que o direito ao acesso à Justiça, previsto no art. 5º, XXXV, da Carta Magna, além da vertente formal perante os órgãos judiciários, implica o acesso a soluções efetivas de conflitos por intermédio de uma ordem jurídica justa e compreende o uso de meios consensuais, voluntários e mais adequados a alcançar a pacificação de disputa;

CONSIDERANDO que, diante da complexidade dos fenômenos conflito e violência, devem ser considerados, não só os aspectos relacionais individuais, mas também, os comunitários, institucionais e sociais que contribuem para seu surgimento, estabelecendo-se fluxos e procedimentos que cuidem dessas dimensões e promovam mudanças de paradigmas, bem como, provendo-se espaços apropriados e adequados;

CONSIDERANDO a relevância e a necessidade de buscar uniformidade, no âmbito nacional, do conceito de Justiça Restaurativa, para evitar disparidades de orientação e ação, assegurando uma boa execução da política pública respectiva, e respeitando as especificidades de cada segmento da Justiça;

CONSIDERANDO que cabe ao Poder Judiciário o permanente aprimoramento de suas formas de resposta às demandas sociais relacionadas às questões de conflitos e violência, sempre objetivando a promoção da paz social;

CONSIDERANDO que os arts. 72, 77 e 89 da Lei 9.099/1995 permitem a homologação dos acordos celebrados nos procedimentos próprios quando regidos sob os fundamentos da Justiça Restaurativa, como a composição civil, a transação penal ou a condição da suspensão condicional do processo de natureza criminal que tramitam perante os Juizados Especiais Criminais ou nos Juízos Criminais;

CONSIDERANDO que o art. 35, II e III, da Lei 12.594/2012 estabelece, para o atendimento aos adolescentes em conflito com a lei, que os princípios da excepcionalidade, da intervenção judicial e da imposição de medidas, favorecendo meios de autocomposição de conflitos, devem ser usados dando prioridade a práticas ou medidas que sejam restaurativas e que, sempre que possível, atendam às vítimas;

CONSIDERANDO que compete ao CNJ o controle da atuação administrativa e financeira do Poder Judiciário, bem como zelar pela observância do art. 37 da Constituição da República;

CONSIDERANDO que compete, ainda, ao CNJ contribuir com o desenvolvimento da Justiça Restaurativa, diretriz estratégica de gestão da Presidência do CNJ para o biênio 2015-2016, nos termos da Portaria 16 de fevereiro de 2015, o que gerou a Meta 8 para 2016, em relação a todos os Tribunais;

CONSIDERANDO o Grupo de Trabalho instituído pela Portaria CNJ 74 de 12 de agosto de 2015 e o decidido pelo Plenário do CNJ nos autos do Ato Normativo 0002377-12.2016.2.00.0000, na 232ª Sessão Ordinária realizada em 31 de maio de 2016;

RESOLVE:

CAPÍTULO I
DA JUSTIÇA RESTAURATIVA

Art. 1º. A Justiça Restaurativa constitui-se como um conjunto ordenado e sistêmico de princípios, métodos, técnicas e atividades próprias, que visa à conscientização sobre os fatores relacionais, institucionais e sociais motivadores de conflitos e violência, e por meio do qual os conflitos que geram dano, concreto ou abstrato, são solucionados de modo estruturado na seguinte forma:

I – é necessária a participação do ofensor, e, quando houver, da vítima, bem como, das suas famílias e dos demais envolvidos no fato danoso, com a presença dos representantes da comunidade direta ou indiretamente atingida pelo fato e de um ou mais facilitadores restaurativos;

II – as práticas restaurativas serão coordenadas por facilitadores restaurativos capacitados em técnicas autocompositivas e consensuais de solução de conflitos próprias da Justiça Restaurativa, podendo ser servidor do tribunal, agente público, voluntário ou indicado por entidades parceiras;

III – as práticas restaurativas terão como foco a satisfação das necessidades de todos os envolvidos, a responsabilização ativa daqueles que contribuíram direta ou indiretamente para a ocorrência do fato danoso e o empoderamento da comunidade, destacando a necessidade da reparação do dano e da recomposição do tecido social rompido pelo conflito e as suas implicações para o futuro.

§ 1º Para efeitos desta Resolução, considera-se:

I – Prática Restaurativa: forma diferenciada de tratar as situações citadas no caput e incisos deste artigo;

II – Procedimento Restaurativo: conjunto de atividades e etapas a serem promovidas objetivando a composição das situações a que se refere o caput deste artigo;

III – Caso: quaisquer das situações elencadas no caput deste artigo, apresentadas para solução por intermédio de práticas restaurativas;

IV – Sessão Restaurativa: todo e qualquer encontro, inclusive os preparatórios ou de acompanhamento, entre as pessoas diretamente envolvidas nos fatos a que se refere o caput deste artigo;

V – Enfoque Restaurativo: abordagem diferenciada das situações descritas no caput deste artigo, ou dos contextos a elas relacionados, compreendendo os seguintes elementos:

a) participação dos envolvidos, das famílias e das comunidades;

b) atenção às necessidades legítimas da vítima e do ofensor;

c) reparação dos danos sofridos;

d) compartilhamento de responsabilidades e obrigações entre ofensor, vítima, famílias e comunidade para superação das causas e consequências do ocorrido.

§ 2º A aplicação de procedimento restaurativo pode ocorrer de forma alternativa ou concorrente com o processo convencional, devendo suas implicações ser consideradas, caso a caso, à luz do correspondente sistema processual e objetivando sempre as melhores soluções para as partes envolvidas e a comunidade.

Art. 2º São princípios que orientam a Justiça Restaurativa: a corresponsabilidade, a reparação dos danos, o atendimento às necessidades de todos os envolvidos, a informalidade, a voluntariedade, a imparcialidade, a participação, o empoderamento, a consensualidade, a confidencialidade, a celeridade e a urbanidade.

§ 1º Para que o conflito seja trabalhado no âmbito da Justiça Restaurativa, é necessário que as partes reconheçam, ainda que em ambiente confidencial incomunicável com a instrução penal, como verdadeiros os fatos essenciais, sem que isso implique admissão de culpa em eventual retorno do conflito ao processo judicial.

§ 2º É condição fundamental para que ocorra a prática restaurativa, o prévio consentimento, livre e espontâneo, de todos os seus participantes, assegurada a retratação a qualquer tempo, até a homologação do procedimento restaurativo.

§ 3º Os participantes devem ser informados sobre o procedimento e sobre as possíveis consequências de sua participação, bem como do seu direito de solicitar orientação jurídica em qualquer estágio do procedimento.

§ 4º Todos os participantes deverão ser tratados de forma justa e digna, sendo assegurado o mútuo respeito entre as partes, as quais serão auxiliadas a construir, a partir da reflexão e da assunção de responsabilidades, uma solução cabível e eficaz visando sempre o futuro.

§ 5º O acordo decorrente do procedimento restaurativo deve ser formulado a partir da livre atuação e expressão da vontade de todos os participantes, e os seus termos, aceitos voluntariamente, conterão obrigações razoáveis e proporcionais, que respeitem a dignidade de todos os envolvidos.

CAPÍTULO II
DAS ATRIBUIÇÕES DO CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA

Art. 3º. Compete ao CNJ organizar programa com o objetivo de promover ações de incentivo à Justiça Restaurativa, pautado pelas seguintes linhas programáticas:

I – caráter universal, proporcionando acesso a procedimentos restaurativos a todos os usuários do Poder Judiciário que tenham interesse em resolver seus conflitos por abordagens restaurativas;

II – caráter sistêmico, buscando estratégias que promovam, no atendimento dos casos, a integração das redes familiares e comunitárias, assim como das políticas públicas relacionadas a sua causa ou solução;

III – caráter interinstitucional, contemplando mecanismos de cooperação capazes de promover a Justiça Restaurativa junto das diversas instituições afins, da academia e das organizações de sociedade civil;

IV – caráter interdisciplinar, proporcionando estratégias capazes de agregar ao tratamento dos conflitos o conhecimento das diversas áreas científicas afins, dedicadas ao estudo dos fenômenos relacionados à aplicação da Justiça Restaurativa;

V – caráter intersetorial, buscando estratégias de aplicação da Justiça Restaurativa em colaboração com as demais políticas públicas, notadamente segurança, assistência, educação e saúde;

VI – caráter formativo, contemplando a formação de multiplicadores de facilitadores em Justiça Restaurativa;

VII – caráter de suporte, prevendo mecanismos de monitoramento, pesquisa e avaliação, incluindo a construção de uma base de dados.

Art. 4º. O programa será implementado com a participação de rede constituída por todos os órgãos do Poder Judiciário e por entidades públicas e privadas parceiras, inclusive universidades e instituições de ensino, cabendo ao Conselho Nacional de Justiça:

I – assegurar que a atuação de servidores, inclusive indicados por instituições parceiras, na Justiça Restaurativa seja não compulsória e devidamente reconhecida para fins de cômputo da carga horária, e que o exercício das funções de facilitador voluntário seja considerado como tempo de experiência nos concursos para ingresso na Magistratura;

II – buscar a cooperação dos órgãos públicos competentes e das instituições públicas e privadas da área de ensino, para a criação de disciplinas que propiciem o surgimento da cultura de não-violência e para que nas Escolas Judiciais e da Magistratura, bem como nas capacitações de servidores e nos cursos de formação inicial e continuada, haja módulo voltado à Justiça Restaurativa;

III – estabelecer interlocução com a Ordem dos Advogados do Brasil, as Defensorias Públicas, as Procuradorias, o Ministério Público e as demais instituições relacionadas, estimulando a participação na Justiça Restaurativa e valorizando a atuação na prevenção dos litígios.

CAPÍTULO III
DAS ATRIBUIÇÕES DOS TRIBUNAIS DE JUSTIÇA

Art. 5º. Os Tribunais de Justiça implementarão programas de Justiça Restaurativa, que serão coordenados por órgão competente, estruturado e organizado para tal fim, com representação de magistrados e equipe técnico-científica, com as seguintes atribuições, dentre outras:

I – desenvolver plano de difusão, expansão e implantação da Justiça Restaurativa, sempre respeitando a qualidade necessária à sua implementação;

II – dar consecução aos objetivos programáticos mencionados no art. 3º e atuar na interlocução com a rede de parcerias mencionada no art. 4º;

III – incentivar ou promover capacitação, treinamento e atualização permanente de magistrados, servidores e voluntários nas técnicas e nos métodos próprios de Justiça Restaurativa, sempre prezando pela qualidade de tal formação, que conterá, na essência, respostas a situações de vulnerabilidade e de atos infracionais que deverão constar dentro de uma lógica de fluxo interinstitucional e sistêmica, em articulação com a Rede de Garantia de Direitos;

IV – promover a criação e instalação de espaços de serviço para atendimento restaurativo nos termos do artigo 6º, desta Resolução.

§1º. Caberá aos tribunais estabelecer parcerias ou disponibilizar recursos humanos e materiais para a instalação e continuidade do programa e dos serviços de atendimento, que contarão com a atuação de facilitadores de processos restaurativos e de equipe técnica interdisciplinar composta por profissionais como psicólogos e assistentes sociais.

§2º. Para os fins do disposto no caput deste artigo, os tribunais deverão apoiar e dar continuidade a eventuais coordenadorias, núcleos ou setores que já venham desenvolvendo a Justiça Restaurativa em suas atividades institucionais.

Art. 6º. Na implementação de projetos ou espaços de serviço para atendimento de Justiça Restaurativa, os tribunais observarão as seguintes diretrizes:

I – destinar espaço físico adequado para o atendimento restaurativo, diretamente ou por meio de parcerias, que deve ser estruturado de forma adequada e segura para receber a vítima, o ofensor e as suas comunidades de referência, além de representantes da sociedade;

II – designar magistrado responsável pela coordenação dos serviços e da estrutura, que deverá contar, também, com pessoal de apoio administrativo;

III – formar e manter equipe de facilitadores restaurativos, arregimentados entre servidores do próprio quadro funcional ou designados pelas instituições conveniadas, os quais atuarão com dedicação exclusiva ou parcial, e voluntários, sempre que possível auxiliados por equipes técnicas de apoio interprofissional;

IV – zelar para que cada unidade mantenha rotina de encontros para discussão e supervisão dos casos atendidos, bem como promova registro e elabore relatórios estatísticos;

V – primar pela qualidade dos serviços, tendo em vista que as respostas aos crimes, aos atos infracionais e às situações de vulnerabilidade deverão ser feitas dentro de uma lógica interinstitucional e sistêmica e em articulação com as redes de atendimento e parceria com as demais políticas públicas e redes comunitárias;

VI – instituir, nos espaços de Justiça Restaurativa, fluxos internos e externos que permitam a institucionalização dos procedimentos restaurativos em articulação com as redes de atendimento das demais políticas públicas e as redes comunitárias, buscando a interconexão de ações e apoiando a expansão dos princípios e das técnicas restaurativas para outros segmentos institucionais e sociais.

CAPÍTULO IV
DO ATENDIMENTO RESTAURATIVO EM ÂMBITO JUDICIAL

Art. 7º. Para fins de atendimento restaurativo judicial das situações de que trata o caput do art. 1º desta Resolução, poderão ser encaminhados procedimentos e processos judiciais, em qualquer fase de sua tramitação, pelo juiz, de ofício ou a requerimento do Ministério Público, da Defensoria Pública, das partes, dos seus Advogados e dos Setores Técnicos de Psicologia e Serviço Social.

Parágrafo único. A autoridade policial poderá sugerir, no Termo Circunstanciado ou no relatório do Inquérito Policial, o encaminhamento do conflito ao procedimento restaurativo.

Art. 8º. Os procedimentos restaurativos consistem em sessões coordenadas, realizadas com a participação dos envolvidos de forma voluntária, das famílias, juntamente com a Rede de Garantia de Direito local e com a participação da comunidade para que, a partir da solução obtida, possa ser evitada a recidiva do fato danoso, vedada qualquer forma de coação ou a emissão de intimação judicial para as sessões.

§ 1º. O facilitador restaurativo coordenará os trabalhos de escuta e diálogo entre os envolvidos, por meio da utilização de métodos consensuais na forma autocompositiva de resolução de conflitos, próprias da Justiça Restaurativa, devendo ressaltar durante os procedimentos restaurativos:

I – o sigilo, a confidencialidade e a voluntariedade da sessão;

II – o entendimento das causas que contribuíram para o conflito;

III – as consequências que o conflito gerou e ainda poderá gerar;

IV – o valor social da norma violada pelo conflito.

§ 2º. O facilitador restaurativo é responsável por criar ambiente propício para que os envolvidos promovam a pactuação da reparação do dano e das medidas necessárias para que não haja recidiva do conflito, mediante atendimento das necessidades dos participantes das sessões restaurativas.

§ 3º. Ao final da sessão restaurativa, caso não seja necessário designar outra sessão, poderá ser assinado acordo que, após ouvido o Ministério Público, será homologado pelo magistrado responsável, preenchidos os requisitos legais.

§ 4º. Deverá ser juntada aos autos do processo breve memória da sessão, que consistirá na anotação dos nomes das pessoas que estiveram presentes e do plano de ação com os acordos estabelecidos, preservados os princípios do sigilo e da confidencialidade, exceção feita apenas a alguma ressalva expressamente acordada entre as partes, exigida por lei, ou a situações que possam colocar em risco a segurança dos participantes.

§5º. Não obtido êxito na composição, fica vedada a utilização de tal insucesso como causa para a majoração de eventual sanção penal ou, ainda, de qualquer informação obtida no âmbito da Justiça Restaurativa como prova.

§6º. Independentemente do êxito na autocomposição, poderá ser proposto plano de ação com orientações, sugestões e encaminhamentos que visem à não recidiva do fato danoso, observados o sigilo, a confidencialidade e a voluntariedade da adesão dos envolvidos no referido plano.

Art. 9º. As técnicas autocompositivas do método consensual utilizadas pelos facilitadores restaurativos buscarão incluir, além das pessoas referidas no art. 1º, § 1º, V, a, desta Resolução, aqueles que, em relação ao fato danoso, direta ou indiretamente:

I – sejam responsáveis por esse fato;

II – foram afetadas ou sofrerão as consequências desse fato;

III – possam apoiar os envolvidos no referido fato, contribuindo de modo que não haja recidiva.

Art. 10. Logrando-se êxito com as técnicas referidas no artigo anterior, a solução obtida poderá ser repercutida no âmbito institucional e social, por meio de comunicação e interação com a comunidade do local onde ocorreu o fato danoso, bem como, respeitados os deveres de sigilo e confidencialidade, poderão ser feitos encaminhamentos das pessoas envolvidas a fim de atendimento das suas necessidades.

Art. 11. As sessões restaurativas serão realizadas em espaços adequados e seguros, conforme disposto no art. 6º desta Resolução.

Art. 12. Quando os procedimentos restaurativos ocorrerem antes da judicialização dos conflitos, fica facultado às partes diretamente interessadas submeterem os acordos e os planos de ação à homologação pelos magistrados responsáveis pela Justiça Restaurativa, na forma da lei.

CAPÍTULO V
DO FACILITADOR RESTAURATIVO

Art. 13. Somente serão admitidos, para o desenvolvimento dos trabalhos restaurativos ocorridos no âmbito do Poder Judiciário, facilitadores previamente capacitados, ou em formação, nos termos do Capítulo VI, desta Resolução.

Parágrafo único. Os facilitadores deverão submeter-se a curso de aperfeiçoamento permanente, realizado na forma do Capítulo VI, o qual tomará por base o que declinado pelos participantes das sessões restaurativas, ao final destas, em formulários próprios.

Art. 14. São atribuições do facilitador restaurativo:

I – preparar e realizar as conversas ou os encontros preliminares com os envolvidos;

II – abrir e conduzir a sessão restaurativa, de forma a propiciar um espaço próprio e qualificado em que o conflito possa ser compreendido em toda sua amplitude, utilizando-se, para tanto, de técnica autocompositiva pelo método consensual de resolução de conflito, própria da Justiça Restaurativa, que estimule o diálogo, a reflexão do grupo e permita desencadear um feixe de atividades coordenadas para que não haja reiteração do ato danoso ou a reprodução das condições que contribuíram para o seu surgimento;

III – atuar com absoluto respeito à dignidade das partes, levando em consideração eventuais situações de hipossuficiência e desequilíbrio social, econômico, intelectual e cultural;

IV – dialogar nas sessões restaurativas com representantes da comunidade em que os fatos que geraram dano ocorreram;

V – considerar os fatores institucionais e os sociais que contribuíram para o surgimento do fato que gerou danos, indicando a necessidade de eliminá-los ou diminuí-los;

VI – apoiar, de modo amplo e coletivo, a solução dos conflitos;

VII – redigir o termo de acordo, quando obtido, ou atestar o insucesso;

VIII – incentivar o grupo a promover as adequações e encaminhamentos necessários, tanto no aspecto social quanto comunitário, com as devidas articulações com a Rede de Garantia de Direito local.

Art. 15. É vedado ao facilitador restaurativo:

I – impor determinada decisão, antecipar decisão de magistrado, julgar, aconselhar, diagnosticar ou simpatizar durante os trabalhos restaurativos;

II – prestar testemunho em juízo acerca das informações obtidas no procedimento restaurativo;

III – relatar ao juiz, ao promotor de justiça, aos advogados ou a qualquer autoridade do Sistema de Justiça, sem motivação legal, o conteúdo das declarações prestadas por qualquer dos envolvidos nos trabalhos restaurativos, sob as penas previstas no art. 154 do Código Penal.

CAPÍTULO VI
DA FORMAÇÃO E CAPACITAÇÃO

Art. 16. Caberá aos tribunais, por meio das Escolas Judiciais e Escolas da Magistratura, promover cursos de capacitação, treinamento e aperfeiçoamento de facilitadores em Justiça Restaurativa, podendo fazê-lo por meio de parcerias.

§1º. O plano pedagógico básico dos cursos de capacitação, treinamento e aperfeiçoamento de facilitadores em Justiça Restaurativa deverá ser estruturado em parceria com o órgão delineado no art. 5º da presente Resolução.

§2º. Levar-se-ão em conta, para o plano pedagógico básico dos cursos de capacitação, treinamento e aperfeiçoamento de facilitadores em Justiça Restaurativa, os dados obtidos nos termos do Capítulo VII da presente Resolução.

§3º. Os formadores do curso referido no caput deste artigo devem ter experiência comprovada em capacitação na área de Justiça Restaurativa, bem como atestados de realização de procedimentos restaurativos e atuação em projetos relacionados à Justiça Restaurativa.

Art. 17. Os cursos de capacitação, treinamento e aperfeiçoamento de facilitadores deverão observar conteúdo programático com número de exercícios simulados e carga horária mínima, conforme deliberado pelo Comitê Gestor da Justiça Restaurativa, contendo, ainda, estágio supervisionado, como estabelecido pelas Escolas Judiciais e Escolas da Magistratura.

Parágrafo único. Será admitida a capacitação de facilitadores voluntários não técnicos oriundos das comunidades, inclusive indicados por instituições parceiras, possibilitando maior participação social no procedimento restaurativo e acentuando como mecanismo de acesso à Justiça.

CAPÍTULO VII
DO MONITORAMENTO E DA AVALIAÇÃO

Art. 18. Os tribunais, por meio do órgão responsável, deverão acompanhar o desenvolvimento e a execução dos projetos de Justiça Restaurativa, prestando suporte e auxílio para que não se afastem dos princípios básicos da Justiça Restaurativa e dos balizamentos contidos nesta Resolução.

§1º. Os tribunais deverão, ainda, valer-se de formulários específicos, pautados nos princípios e na metodologia próprios da Justiça Restaurativa, conforme Resolução CNJ 76/2009.

§2º. A criação e manutenção de banco de dados sobre as atividades da Justiça Restaurativa é de responsabilidade dos tribunais.

Art. 19. Caberá ao CNJ compilar informações sobre os projetos de Justiça Restaurativa existentes no país e sobre o desempenho de cada um deles.

Parágrafo único. Com base nas informações oriundas dos tribunais, o CNJ promoverá estudos, com auxílio de especialistas, para fins de elaboração de plano disciplinar básico para a formação em Justiça Restaurativa junto às Escolas Judiciais e Escolas da Magistratura.

Art. 20. Serão adotados, pelos Tribunais de Justiça, parâmetros adequados para a avaliação dos projetos de Justiça Restaurativa, preferencialmente, com instituições parceiras e conveniadas.

CAPÍTULO VIII
DISPOSIÇÕES FINAIS

Art. 21. Os tribunais, consideradas as peculiaridades locais no âmbito de sua autonomia, estabelecerão parâmetros curriculares para cursos de capacitação, treinamento e aperfeiçoamento de facilitadores, com número de exercícios simulados, carga horária mínima e estágio supervisionado.

Art. 22. Para fins de efetivação do disposto no art. 35, II, da Lei 12.594/2012, poderão os tribunais certificar como aptos ao atendimento extrajudicial de autocomposição de conflitos, os espaços de serviço mantidos por organizações governamentais ou não governamentais, que atendam aos qualificativos estabelecidos nesta Resolução.

Art. 23. Fica acrescido o seguinte dispositivo ao § 1º do art. 2º da Resolução CNJ 154/2012:

“V – Projetos de prevenção e ou atendimento a situações de conflitos, crimes e violências, inclusive em fase de execução, que sejam baseados em princípios e práticas da Justiça Restaurativa.”

Art. 24 Fica acrescido o seguinte parágrafo ao art. 3º da Resolução CNJ 128/2011:

“§3º. Na condução de suas atividades, a Coordenadoria Estadual da Mulher em Situação de Violência Doméstica e Familiar deverá adotar, quando cabível, processos restaurativos com o intuito de promover a responsabilização dos ofensores, proteção às vítimas, bem como restauração e estabilização das relações familiares.”

Art. 25. Portaria da Presidência do CNJ poderá instituir selo de reconhecimento, e seu respectivo regulamento, aos tribunais que implementarem os objetivos da presente Resolução.

Art. 26. O disposto nesta Resolução não prejudica a continuidade de eventuais programas similares, coordenadorias, núcleos ou setores já em funcionamento, desde que desenvolvidos em consonância com os princípios da Justiça Restaurativa apresentados nesta Resolução.

Art. 27. Compete à Presidência do CNJ, com o apoio da Comissão Permanente de Acesso à Justiça e Cidadania, coordenar as atividades da Política Judiciária Nacional no Poder Judiciário, assim como instituir e regulamentar o Comitê Gestor da Justiça Restaurativa, que será responsável pela implementação e acompanhamento das medidas previstas nesta Resolução.

Art. 28. Os tribunais, consideradas as peculiaridades locais e autonomia, poderão suplementar esta Resolução naquilo que não lhe for contrário.

Art. 29. Esta Resolução aplica-se, no que couber, à Justiça Federal.

Art. 30. Esta Resolução entra em vigor após decorridos sessenta dias de sua publicação.

Ministro Ricardo Lewandowski