RESOLUÇÃO Nº 018/2023 – DISP. 06/06/2023


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PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO ESPÍRITO SANTO – PJES

RUA DESEMBARGADOR HOMERO MAFRA,60 – Bairro ENSEADA DO SUÁ – CEP 29050906 – Vitória – ES – www.tjes.jus.br

 

RESOLUÇÃO Nº. 018/2023

 

 

INSTITUI, no âmbito do Poder Judiciário do Estado do Espírito Santo, a metodologia de realização de audiências concentradas socioeducativas, nos casos das medidas socioeducativas de internação e semiliberdade nas Varas da Infância e Juventude com competência para execução das medidas socioeducativas que impliquem em privação de liberdade.

O Presidente em Exercício do Tribunal de Justiça do Estado do Espírito Santo, no uso das atribuições que lhe conferem o artigo 30, da Lei Complementar Estadual 234/2002 e o artigo 58, inciso I, do Regimento Interno do Tribunal de Justiça do Estado do Espírito Santo, tendo em vista decisão do Egrégio Tribunal Pleno na Sessão Administrativa Ordinária do dia 01 de junho de 2023;

 

CONSIDERANDO o dever de proteção integral aos direitos das crianças e dos adolescentes, conforme previsto no artigo 227 da Constituição Federal e no artigo 4º, alínea “b”, parágrafo único, da Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990 (Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA), bem como a prioridade na tramitação dos processos e procedimentos, e na execução dos atos e diligências judiciais afetos à infância (artigo 152);

CONSIDERANDO que a prioridade na garantia de direitos de crianças e adolescentes é um dever dos Estados Partes na comunidade internacional, conforme artigos 21 e 45 da Declaração e Programa de Ação de Viena;

CONSIDERANDO que a Lei do SINASE (Lei n° 12.594, de 18 de janeiro de 2012) prevê, em seu artigo 35, os princípios que devem reger a execução das medidas socioeducativas, tais como a brevidade, excepcionalidade, respeito à condição peculiar de pessoa em desenvolvimento, mínima intervenção e fortalecimento dos vínculos familiares e comunitários no processo socioeducativo;

CONSIDERANDO que os artigos 120 e 121 do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) estabelecem que as medidas socioeducativas de internação e semiliberdade se configuram como restritivas de liberdade e devem estar sujeitas aos princípios de brevidade e excepcionalidade;

CONSIDERANDO que a reavaliação das medidas socioeducativas pode ser solicitada a qualquer tempo, a pedido da direção do programa de atendimento, do defensor, do Ministério Público, do adolescente, de seus pais ou responsável (artigo 43 da Lei nº 12.594/2012), devendo ser subsidiada da fundamentação de parecer técnico do programa de atendimento e precedida de prévia audiência;

CONSIDERANDO que, independente do transcurso do prazo de seis meses a que alude o artigo 121, §2º, do ECA e de requerimento das partes, a reavaliação de medida socioeducativa pode ser processada imediatamente após o envio do relatório do programa de atendimento socioeducativo, conforme disposto no artigo 14 da Resolução n° 165, de 16 de novembro de 2012, do Conselho Nacional de Justiça;

CONSIDERANDO a Resolução CNJ nº 367/2021, que institui as diretrizes e normas gerais para a implementação da Central de Vagas no Sistema Estadual de Atendimento Socioeducativo, no âmbito do Poder Judiciário, e estabelece a audiência concentrada socioeducativa;

 

CONSIDERANDO a necessidade de orientar-se pela aplicação de práticas restaurativas, conforme estabelecido na Resolução nº 225, de 31 de maio de 2016, do Conselho Nacional de Justiça, bem como no artigo 35, incisos II e III, da Lei nº 12.594, de 18 de janeiro de 2012;

CONSIDERANDO a Recomendação nº 98, de 26 de maio de 2021, que aconselha aos tribunais e autoridades judiciárias a adoção de diretrizes e procedimentos específicos para a realização de audiências concentradas com o objetivo de reavaliar as medidas socioeducativas de internação e semiliberdade;

RESOLVE:

Art. 1º. Estabelece-se a metodologia de Audiências Concentradas para efeito de reavaliação das medidas socioeducativas de internação e semiliberdade, considerando as finalidades dispostas no artigo 2º da Recomendação nº 98, de 26 de maio de 2021, do Conselho Nacional de Justiça.

§ 1º. Entende-se por Audiências Concentradas o conjunto de esforços no acompanhamento processual sob a direção da autoridade judiciária, no qual se congregam as execuções de medidas socioeducativas em regime fechado, visando a reanálise das situações individuais de todos os adolescentes e jovens sujeitos às medidas socioeducativas de internação e semiliberdade.

§ 2º. A reavaliação dos processos judiciais dos adolescentes e jovens que cumprem as medidas socioeducativas de internação e semiliberdade deve ser efetuada pelo Juízo da Execução, com o auxílio técnico da equipe interprofissional pertinente e de representantes do programa de atendimento socioeducativo, contando com a participação do Ministério Público, da defesa técnica, do socioeducando, seus pais ou responsáveis, e das instituições do Poder Executivo Municipal ou Estadual, com competência para o atendimento das demandas identificadas.

§ 3º. As audiências concentradas poderão ocorrer, preferencialmente a cada 3 (três) meses, sendo designadas, mediante decisão fundamentada do magistrado, antes ou depois desse prazo, respeitado o limite de 6 (seis) meses para reavaliação da medida.

§ 4º. A realização de audiências concentradas não prejudica o processamento de pedido de reavaliação das medidas em qualquer momento, conforme o art. 43 da Lei nº 12.594/2012;

§ 5º. Os locais para a realização dessas audiências serão, preferencialmente, nas unidades de internação e semiliberdade, podendo o ato ser efetuado, excepcionalmente, por decisão fundamentada, nas dependências da unidade judiciária, de maneira semipresencial ou virtual, observada a garantia do sigilo.

§ 6º. É proibida a realização de audiência com mais de um socioeducando, em respeito ao princípio da individualização da execução das medidas socioeducativas.

§ 7º. O magistrado com competência em execução de medida socioeducativa poderá, facultativamente, empregar a mesma metodologia para a reavaliação de medidas socioeducativas em meio aberto.

Art. 2º. A organização e planejamento das audiências concentradas deverão observar as seguintes diretrizes:

I – Em cada processo de execução de medida socioeducativa, deverão constar os relatórios técnicos atualizados do socioeducando, com avaliação acerca do Plano Individual de Atendimento (PIA) elaborado para o mesmo, encaminhados até 30 dias antes da audiência.

II – O programa de atendimento socioeducativo deverá ser notificado pela autoridade judiciária a fim de viabilizar a participação das famílias dos adolescentes na audiência concentrada.

III – Convocação dos técnicos de referência do Poder Executivo Municipal e/ou Estadual, com competência para a realização de eventuais encaminhamentos para o atendimento de demandas relativas à internação e/ou à transição para o meio aberto.

IV – No planejamento e desenvolvimento da audiência concentrada, devem ser priorizados os princípios, métodos e técnicas da Justiça Restaurativa, conforme a Resolução n° 225, de 31 de maio de 2016, do Conselho Nacional de Justiça, bem como o artigo 35, II e III, da Lei n° 12.594, de 18 de janeiro de 2012 e regulamentações internas do Tribunal de Justiça do Estado do Espírito Santo.

§ 1º. A autoridade judiciária poderá criar um Comitê Local de Interlocução para estabelecer espaço de diálogo e planejamento das audiências concentradas, incluindo representantes da Defensoria Pública, do Ministério Público, do Poder Executivo, dos programas de atendimento socioeducativo, da Sociedade Civil Organizada e de instituições que desenvolvam ações no âmbito das unidades socioeducativas com comprovada contribuição para a construção e cumprimento do PIA.

§ 2º. Os familiares e socioeducandos devem ser acolhidos em ambiente adequado antes do início das audiências concentradas, a fim de receberem orientações acerca da finalidade e funcionamento das audiências concentradas, em linguagem clara e acessível.

§ 3º. O Juízo competente poderá solicitar à Coordenadoria da Infância e Juventude e ao Grupo de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Socioeducativo (GMF-SS) que, no âmbito de suas atribuições legais, ofereçam suporte às audiências concentradas, especialmente nos aspectos logísticos e procedimentais.

 

Art. 3º. A autoridade judiciária adotará o seguinte procedimento para entrevistar o socioeducando durante as Audiências Concentradas:

I – esclarecer a natureza da audiência de reavaliação e destacar as questões a serem analisadas pela autoridade judiciária;

II – indagar acerca do tratamento recebido durante o cumprimento da medida socioeducativa, questionando, em particular, as condições de execução da medida e a ocorrência de violações de direitos, como a prática de tortura e outros tratamentos ou penas cruéis, desumanos ou degradantes;

III – perguntar sobre a participação do socioeducando na elaboração do Plano Individual de Atendimento e acerca da realização das atividades nele previstas;

IV – questionar a respeito da participação do socioeducando no processo de avaliação da medida socioeducativa e sua percepção sobre seu percurso socioeducativo;

V – no caso de registro de sanção disciplinar aplicada ao adolescente, averiguar as circunstâncias da apuração da falta disciplinar, a garantia da ampla defesa e contraditório, e a observância das disposições legais aplicáveis;

VI – formular outras perguntas que julgar pertinentes, enfocando a avaliação do Plano Individual de Atendimento e perguntar se deseja fazer algum pedido diretamente à autoridade judiciária.

§ 1º. A autoridade judiciária concederá ao Ministério Público e à defesa técnica, nesta ordem, a oportunidade de formular reperguntas compatíveis com a natureza do ato judicial.

§ 2º. Deve ser facultada a palavra aos pais ou responsáveis para se manifestarem sobre sua participação no cumprimento do plano individual e formular os pedidos que considerarem adequados.

§ 3º. Após a oitiva do socioeducando e de seus pais ou responsáveis, e, se for o caso, das equipes técnicas do programa de atendimento socioeducativo e de outras instituições que contribuam com a construção e execução do PIA, bem como da equipe interprofissional do Juízo, a autoridade judiciária concederá ao Ministério Público e à defesa técnica, nesta ordem, a oportunidade de formular requerimentos, podendo pleitear:

a) a manutenção, substituição, suspensão ou extinção da medida socioeducativa;

b) a adoção de medidas protetivas ou outras providências necessárias no caso concreto.

Art. 4º. A ata da audiência conterá a decisão fundamentada acerca da manutenção, substituição, suspensão ou extinção da medida socioeducativa, incluindo a possibilidade de encaminhamento para procedimento restaurativo, bem como as providências adotadas caso sejam constatados indícios de tortura e outros tratamentos ou penas cruéis, desumanos ou degradantes, ameaça de morte ou irregularidades a serem sanadas, assim como os encaminhamentos para o Poder Executivo Municipal ou Estadual.

Parágrafo único. Proferidas as decisões judiciais de substituição, suspensão ou extinção da medida socioeducativa, deverão ser realizadas as atualizações pertinentes das Guias, com a substituição da medida ou baixa da Guia, no Cadastro Nacional de Adolescentes em Conflito com a Lei (CNACL).

Art. 5º. Concluída a audiência de reavaliação, o socioeducando e seus familiares serão encaminhados, pela equipe interprofissional do Juízo, aos representantes dos órgãos do Poder Executivo presentes em sala separada, para a realização dos encaminhamentos pertinentes, inclusive eventuais programas de acompanhamento ao adolescente após o cumprimento da medida socioeducativa disponíveis na localidade.

Art. 6º. Esta Resolução entra em vigência na data de sua publicação.

 

Publique-se no Diário da Justiça Eletrônico por 03 dias consecutivos.

 

 

Vitória, 1º de junho de 2023.

 

 

 

Desembargador Dair José Bregunce de Oliveira

Presidente em Exercício