ATO NORMATIVO CONJUNTO Nº 003/2023 – DISP. 01/03/2023


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PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO ESPÍRITO SANTO – PJES

RUA DESEMBARGADOR HOMERO MAFRA,60 – Bairro ENSEADA DO SUÁ – CEP 29050906 – Vitória – ES – www.tjes.jus.br

 

 

ATO NORMATIVO CONJUNTO Nº  003/2023

 

 

Dispõe sobre os procedimentos de atendimento nos serviços da rede de atenção e cuidado materno-infantil, encaminhamentos ao Poder Judiciário e sua intervenção quando gestantes ou genitoras manifestarem interesse em entregar espontaneamente seu filho recém-nascido ou aderir expressamente ao pedido de colocação em família substituta na modalidade de adoção.

 

O Excelentíssimo Senhor Desembargador FABIO CLEM DE OLIVEIRA, Presidente do Tribunal de Justiça do Estado do Espírito Santo, O Excelentíssimo Senhor Desembargador CARLOS SIMÕES FONSECA, Corregedor Geral da Justiça do Estado do Espírito Santo, e o Excelentíssimo Senhor Desembargador JORGE HENRIQUE VALLE DOS SANTOS, no uso de suas atribuições legais e,

CONSIDERANDO que a Constituição Federal consagra a proteção integral à criança e ao adolescente com prioridade absoluta;

CONSIDERANDO a obrigatoriedade de encaminhamento à Justiça da Infância e da Juventude de gestantes ou genitoras que manifestarem interesse em entregar seus filhos recém-nascidos para adoção, nos termos do §1º do art. 13 da Lei n° 8.069/1990 (Estatuto da Criança e do Adolescente);

CONSIDERANDO que incumbe ao poder público, dentre outros, proporcionar assistência psicológica à gestante e à genitora que, no período pré e pós-natal, manifeste interesse em entregar espontaneamente seu filho recém-nascido ou aderir expressamente ao pedido de colocação em família substituta na modalidade de adoção, como forma de prevenir ou minorar as consequências do estado puerperal, nos termos do § 5° do art. 8° e art. 166 da Lei n° 8.069/1990 (Estatuto da Criança e do Adolescente);

CONSIDERANDO que as políticas de atendimento aos direitos da mulher e aos direitos da criança e do adolescente devem ser feitas através de um conjunto articulado de ações governamentais e não governamentais;

CONSIDERANDO a necessidade de evitar qualquer tipo de intermediação informal, ainda que não revestida de dolo, no sentido de encaminhamento direcionado de bebês para família substituta, em detrimento da colocação em família substituta previamente habilitada para adoção;

CONSIDERANDO a necessidade de regulamentar o procedimento para encaminhamento à Justiça da Infância e da Juventude das gestantes e genitoras que manifestem interesse em aderir espontaneamente a colocação de seus bebês em família substituta na modalidade de adoção, delimitando as atribuições dos profissionais da rede de atenção e cuidado materno infantil e dos servidores da justiça, no que diz respeito à assistência social e psicológica da gestante ou genitora, inclusive sua oitiva em juízo;

CONSIDERANDO a necessidade atualizar a normatização deste e. Tribunal de Justiça que dispõe sobre entrega voluntária, vide as alterações legislativas posteriores, especialmente a Resolução nº 485, de 18 de janeiro de 2023 do CNJ.

 

 

DISPÕEM:

 

 

DO ATENDIMENTO À GESTANTE:

 

 

Art. 1º. A gestante que manifestar, em qualquer um dos serviços da rede de atenção e cuidado materno-infantil do território, interesse em entregar espontaneamente seu filho recém-nascido, deve ser atendida e orientada por profissional, preferencialmente, assistente social e/ou psicólogo.

 

 

Art. 2º. O profissional da rede de atenção e cuidado materno-infantil que realizar o atendimento inicial deve encaminhar a gestante ao Sistema de Garantia de Direitos conforme as demandas apresentadas, especialmente à assistência psicológica, garantida pelo Sistema Único de Saúde (SUS), como disposto no §4º do art. 8º da Lei n° 8.069/1990 (Estatuto da Criança e do Adolescente).

Art. 3º. O profissional da rede de atenção e cuidado materno-infantil deve encaminhar obrigatoriamente a gestante à Vara com competência em matéria da Infância e da Juventude da comarca de sua residência.

Art. 4º. O profissional da rede de atenção e cuidado materno-infantil deve encaminhar relatório informativo, devidamente assinado, que será analisado na Vara com competência em matéria da Infância e da Juventude, contendo:

 

I – identificação da gestante, seu telefone e endereço;

 

II – os motivos para a decisão de entregar o futuro filho;

 

III – informações quanto à identidade e endereço do suposto genitor do bebê, informando no caso de desconhecimento da genitora ou sua recusa em fornecer os dados mencionados;

 

IV – informações quanto à existência de familiares que tenham interesse e condições de responsabilizar-se pela guarda da criança;

V – demais informações que sejam pertinentes.

Art. 5º. A Vara com competência em matéria da Infância e da Juventude deve aguardar o comparecimento espontâneo da gestante para atendimento.

§ 1º Deve ser informado ao serviço da rede de atenção e cuidado materno-infantil o não comparecimento da gestante referenciada para as intervenções que se fizerem necessárias.

§ 2º A gestante que comparecer, seja a partir de encaminhamento recebido de serviço da rede ou por demanda espontânea, será atendida, pronta e preferencialmente, por equipe psicossocial, que realizará:

 

I – a acolhida dessa mulher;

 

II – a escuta e análise das motivações relacionadas à intenção de entregar seu filho recém-nascido;

 

III – a orientação sobre as questões jurídicas da adoção e as consequências de seu ato;

 

IV – a busca de informações acerca da paternidade da criança;

V – a avaliação da possibilidade de permanência do bebê na família de origem ou extensa;

VI – investimento na promoção da autonomia da mulher e no respeito à sua decisão;

VII – encaminhamento da mulher aos serviços da rede de atendimentos, se necessário;

VIII – orientações sobre os procedimentos que serão realizados, após o nascimento da criança, caso a mulher se decida efetivamente pela entrega do bebê;

IX – emissão de Termo de Comparecimento que deve ser apresentado pela gestante ao hospital ou maternidade por ocasião do parto, conforme modelo constante no Anexo 1.

 

 

DO ACOMPANHAMENTO DA PARTURIENTE:

 

 

Art. 6º. A parturiente que der entrada em maternidade ou hospital e manifestar interesse de entregar voluntariamente seu bebê deve ser atendida e orientada por profissional do referido serviço, preferencialmente por assistente social e/ou psicólogo.

§ 1º O profissional da maternidade ou hospital que realizar o atendimento previsto no caputdeve colher, desde que seja esta a vontade da parturiente, dados sobre a identidade, o endereço e o telefone do suposto genitor e a existência de familiares que tenham interesse e condições de responsabilizar-se pela guarda da criança.

§ 2º O profissional da maternidade ou hospital que realizar o atendimento previsto no caput deve comunicar à Vara com competência em matéria da Infância e da Juventude, e encaminhar relatório informativo, preferencialmente, por meio eletrônico, com os dados obtidos, acompanhados da cópia da Declaração de Nascido Vivo (DNV) ou Certidão de Nascimento da Criança, nos casos em que persistir a intenção de entregar o bebê.

§ 3º Caso não seja utilizado meio eletrônico de comunicação, o relatório informativo deve ser encaminhado no início do expediente do próximo dia útil, quando o nascimento da criança ocorra fora do expediente forense.

§ 4º Deve ser respeitada a integridade física e psicológica da parturiente e a sua decisão de não amamentar ou manter contato com a criança, providenciando acomodação em separado para ambos, evitando-se qualquer tipo de constrangimento e discriminação.

Art. 7º. A autoridade judiciária deve determinar, de ofício, a autuação do relatório informativo recebido da maternidade ou hospital, adotando, em seguida, as providências que julgar apropriadas.

Art. 8º. O hospital ou maternidade deve orientar a parturiente a comparecer à Vara com competência na matéria da Infância e da Juventude no início do expediente do primeiro dia útil subsequente à alta hospitalar.

 

 

DO ATENDIMENTO AO NEONATO:

 

 

Art. 9º. O hospital ou maternidade deve encaminhar relatório informativo, preferencialmente, por meio eletrônico à Vara com competência na matéria da Infância e da Juventude, contendo a confirmação da alta hospitalar da criança (dia e horário) e as seguintes informações:

I – se foi apurado que a genitora mantém a decisão de entregar o bebê de forma voluntária e livre de qualquer ameaça, coação ou induzimento e não pretende exercer os poderes familiares inerentes ao recém-nascido;

II – se compareceu o genitor do bebê ou membro da família extensa em algum setor do hospital ou maternidade manifestando interesse sobre a guarda.

Art. 10. A autoridade judiciária deve determinar, por meio de expedição de mandado, o acolhimento familiar ou, não sendo este possível, o acolhimento institucional da criança, sempre que entender ser essa a medida mais adequada, expedindo a respectiva Guia de Acolhimento e registrando as informações no Sistema Nacional de Adoção e Acolhimento – SNA.

§ 1º A direção do hospital ou maternidade deve entregar a via original da Declaração de Nascido Vivo ao profissional responsável pelo cumprimento do mandado.

§ 2º A equipe técnica do serviço de acolhimento não deve estabelecer contato com a família extensa da criança até ulterior deliberação, constando tal informação na Guia de Acolhimento.

§ 3º O hospital ou maternidade deve aguardar o início do expediente forense e acionar o Conselho Tutelar de sua região para ser realizado o acolhimento emergencial da criança nos casos em que ocorra alta fora do horário de funcionamento da Vara com competência em matéria da Infância e da Juventude, comunicando incontinente o fato à autoridade judiciária.

 

DO ACOMPANHAMENTO EM JUÍZO:

 

 

Art. 11. Serão autuadas e registradas na classe “Entrega Voluntária” (15140) as informações instrumentalizadas e respectivos documentos colhidos, assim como relatório técnico, quando
possível a realização imediata do atendimento interprofissional, remetendo-se em seguida ao representante do Ministério Público.

§ 1º. O procedimento tramitará com prioridade e em segredo de justiça.

§ 2º. Caso a pessoa gestante ou parturiente não tenha advogado constituído, ser-lhe-á imediatamente nomeado um defensor público ou, na impossibilidade, advogado dativo para acompanhamento durante o processo e, notadamente, na audiência de que trata o art. 166, § 1º do ECA, possibilitando entrevista prévia com o defensor, em ambiente com privacidade, para receber orientação jurídica qualificada.

§ 3º. A pretensão também poderá ser deduzida diretamente em juízo sob o patrocínio da Defensoria Pública ou do advogado.

Art. 12. A equipe técnica que atende as Varas com competência em matéria da Infância e da Juventude deve:

I – orientar a genitora sobre seus direitos e sobre os direitos da criança;

 

II – prestar os esclarecimentos sobre o procedimento de entrega voluntária e todos os aspectos que envolvem a adoção;

III – respeitar o desejo da mulher de manter sigilo sobre a sua gestação e a entrega voluntária da criança;

IV – informar que pode ser contatado o genitor ou familiar para averiguar condições e interesses na guarda da criança;

V – indagar a genitora sobre a identidade do suposto genitor da criança e a existência de familiares que tenham interesse e condições de assumir a guarda,

VI – sugerir os devidos encaminhamentos ao Sistema de Garantia de Direitos que entenderem adequados, especialmente atendimento psicológico e socioassistencial na rede protetiva local;

VII – elaborar relatório circunstanciado a fim de subsidiar a autoridade judiciária, fazendo referência às condições psicológicas relacionadas ao discernimento da genitora e seu estado puerperal.

 

Art. 13. Comunicado, no processo, o nascimento da criança ou em se tratando de criança já nascida quando da judicialização, a autoridade judiciária:

I – determinará o acolhimento familiar ou, não sendo este possível, o acolhimento institucional da criança, com respectiva emissão da guia de acolhimento no Sistema Nacional de Adoção e Acolhimento (SNA) tão logo o procedimento se efetive, indicando como ‘Tipo de Processo’ a ‘Entrega Voluntária’; e

II – persistindo o interesse na entrega do recém-nascido para adoção, com base em relatório emitido por equipe técnica interprofissional, e após a alta hospitalar, salvo restrições médicas, designará audiência para ratificação do consentimento sobre a adoção, em até 10 (dez) dias.

§ 1º Caso seja ratificado o desejo de entregar a criança para adoção, a autoridade judiciária homologará a entrega e declarará a extinção do poder familiar (art. 166, § 1º, II do ECA), preferencialmente em audiência, na forma dos arts. 19-A, § 8º e 166, § 5º do ECA.

§ 2º Havendo pai registral ou indicado, também será ouvido em audiência, observadas as mesmas formalidades pertinentes à mãe.

§ 3º A audiência dos genitores, conforme recomendação da equipe técnica, poderá ser realizada por profissional qualificado em processo de escuta, designado pela autoridade judiciária, com registro do depoimento em meio eletrônico ou magnético, devendo a mídia integrar o processo.

 

 

Art. 14. O consentimento é retratável até a data da realização da audiência especificada no artigo anterior, e os genitores podem exercer o arrependimento no prazo de 10 (dez) dias, contado da data de prolação da sentença de extinção do poder familiar (art. 19-A, § 8º, e art. 166, § 5º, ambos do ECA).

§ 1º O exercício do direito de retratação e de arrependimento deve ser garantido de forma simplificada e diversificada, mediante mera certidão cartorária ou informação à equipe técnica, dentre outros, e entrega de comprovante de protocolo.

§ 2º Na hipótese do caput, a criança será mantida ou entregue imediatamente aos genitores, salvo decisão fundamentada, e a família será acompanhada por um período de 180 (cento e oitenta) dias (art. 19-A, § 8º do ECA).

Art. 15. Após o decurso do prazo para arrependimento a que faz alusão o art. 166, § 5º do ECA, o juízo determinará a inclusão imediata da criança no Sistema Nacional de Adoção e Acolhimento, para adoção por pessoas habilitadas.

Art. 16. A entrega, na forma desta Resolução, dispensa a deflagração de procedimento oficioso de averiguação de paternidade, a que faz menção o art. 2º da Lei n. 8.560/1992.

 

 

Art. 17. Este Ato entra em vigor na data de sua publicação, revogando-se as disposições em contrário, especialmente o Ato Normativo Conjunto nº 09/2022.

 

 

Publique-se no Diário da Justiça Eletrônico por 03 dias consecutivos.

 

Vitória, 28 de fevereiro de 2023

 

 

 

DESEMBARGADOR  FABIO CLEM DE OLIVEIRA

Presidente do Tribunal de Justiça

 

DESEMBARGADOR  CARLOS SIMÕES FONSECA

Corregedor Geral da Justiça

 

DESEMBARGADOR  JORGE HENRIQUE VALLE DOS SANTOS

Supervisor das Varas da Infância e da Juventude